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Da Rede - Uma reforma administrativa com foco errado

Publicado no GGN

Não existe nada pior na administração pública do que as medidas tomadas de afogadilho. Principalmente quando mexem com processos internos da máquina pública.

A estrutura do Estado é diferente de uma empresa privada. Na empresa privada há um objetivo unificador: o lucro. E toda uma literatura a respeito da organização de cada setor, identificando as melhores práticas.

O setor público é diferente. Ele deve refletir a própria estrutura social e política da República. Por isso mesmo não se move por manuais, mas por construções sociais e econômicas personalíssimas.

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A transformação de secretarias de direitos humanos em Ministérios foi uma dessas obras sociais construídas ao longo de anos. Abriu-se espaço para as novas bandeiras. Esses espaços foram sendo apropriados por representantes dos mais diversos setores. Depois, ganharam status de Ministério, podendo transitar por outros ministérios através de políticas horizontais.

Era como cada minoria se visse representada na estrutura do governo – e do Estado.

Em cima do novo modelo, foi construída toda uma engenharia social, de consolidação de laços com segmentos da sociedade e de formas de relacionamento intra-governo, como ocorre com a Secretaria de Direitos Humanos, das Mulheres, da Igualdade Racial e assim por diante.

Internamente, foram anos e anos para aprimorar as formas de relacionamento com outros Ministérios e autarquias.

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O mesmo aconteceu com outras políticas horizontais voltadas para produtividade, como é o caso do setor de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC).

Hoje em dia é setor estratégico para qualquer país. Seu faturamento global supera os das próprias indústrias petrolífera e automobilística. Caminha para ser a próxima revolução industrial, com a chamada Internet das Coisas.

Em vários países tornou-se peça central na formulação de políticas econômicas e principalmente na formulação das agendas futuras.

No Brasil, apenas o setor industrial de TICs tem faturamento superior a R$ 100 bilhões, com mais de 130 mil empregos diretos. Além disso, foi responsável pela construção de vários centros de P & D (Pesquisa e Desenvolvimento) bancados por setores produtivos.

A reforma administrativa anunciada pretende extinguir a Secretaria de Política de Informática, hoje ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia.

Na outra ponta, a junção do Ministério da Previdência com o do Trabalho criará um pterodáctilo que não dará conta nem de uma coisa ou outra.

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Ora, mesmo deixando de lado as diferenças entre Estado e iniciativa privada, nenhum dos dois ambientes pode-se basear em análises simplórias de superposição de funções para definir enxugamento.

Em todas as organizações há setores-âncora para cada atividade horizontal, cujas ações são distribuídas pelos diversos departamentos. Cabe a esses setores definir a formas de implementação de cada politica corporativa da qual ele é responsável.

Há um grande desafio pela frente, que consiste na desburocratização do Estado. É tarefa ciclópica mas, seguramente, não é esse o caminho percorrido pela reforma administrativa.

Implementada de afogadilho, ela poderá destruir grande parte dessa cultura do setor público, que permitiu avanços substanciais em diversas frentes. Praticamente paralisou os trabalhos nesses órgãos, substituiu o entusiasmo pela descrença, desmontará programas vitoriosos.

Tudo isso pela economia de alguns salários de Ministérios e Secretários, de valor ínfimo perto do orçamento público.


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